quarta-feira, 11 de julho de 2012

O medo da castração ronda as eleições de 2012


Algumas atitudes de departamentos jurídicos de prefeituras neste período de início de campanha eleitoral têm me chamado a atenção para a manifestação de um fenômeno definido por Sigmund Freud como o complexo de castração[i]. Por temer as punições previstas na Resolução 23.370 do TSE, as assessorias de imprensa estão sendo amordaçadas. Nada, absolutamente nada, pode ser divulgado, tendo em vista a iminente multa a ser aplicada (a ansiedade provocada pelo medo leva a uma paralisia de todo o sistema, através de um mecanismo de anulação do desejo). A Justiça passa a ser vista como o pai a ser temido e, numa atitude regressiva, os atores do jogo político, ao invés de procurar compreender melhor o seu próprio papel, acabam por renunciar a si mesmos , numa atitude de submissão neurótica.

Toda a complexidade individual está intimamente relacionada com o todo representado pela sociedade e sua cultura. Conforme aponta Jorge Ponciano Ribeiro[ii], “o grupo social é o responsável pela saúde mental e pela neurose de seus indivíduos, porque o conflito, na realidade, se origina do confronto entre os impulsos instintivos do indivíduo e os tabus culturais de seu grupo”.  Dessa forma, é perfeitamente compreensível como a sociedade está se moldando através do medo e deixando de agir sob o temor da punição.

O cenário político em análise aqui é restrito a algumas cidades da Região dos Lagos, no Estado do Rio, mas pode servir de referência a outros contextos do interior do país, dada a similaridade de algumas ações inscritas no inconsciente coletivo.

Retomando a questão jornalística, a própria lei citada deixa claro que a divulgação de publicidade (ou matérias jornalísticas) “deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”. Devido ao medo, as palavras “educativo, informativo ou de orientação social” não foram lidas de acordo com seu real significado (ficaram oculta da consciência), tendo os intérpretes fixado sua atenção somente no final do texto (“promoção pessoal”), restringindo toda e qualquer publicidade a uma forma de promover pessoas e não como meio de transmissão de  informações de importância coletiva. Uma das assessorias chegou a encaminhar uma mensagem com a programação de uma festa junina, pedindo aos jornalistas que não a publiquem em seus jornais. Ou seja: a população não pode ser informada de um acontecimento público, porque a Prefeitura que promove o evento não quer ser punida (mesmo que a punição aqui seja infundada, baseada somente no medo).

O medo é um fenômeno tanto individual quanto social e se espalha de forma a ser algo paralisante, embotando mesmo a consciência humana, repercutindo em toda a comunidade. Segundo Edward Bach[iii], o medo atua desempenhando um importante papel na intensificação da doença, compreendendo-se aqui, em minha abordagem, doença como qualquer desarmonia na totalidade da vida humana, tanto no corpo físico, psíquico ou social.

A análise feita até aqui serve para chamar a atenção para dois fatos. Primeiramente, que a sociedade e o indivíduo formam uma totalidade, e que muitas vezes fenômenos tipicamente individuais estão presentes em atos coletivos. E em segundo lugar, a necessidade de estarmos atentos a nossas atitudes sob o ponto de vista da clareza, da consciência de nossos sentimentos, emoções e reações diante do mundo, para que não nos tornemos submissos e cegos diante de adversidades ou momentos em que a dificuldade parece ser maior do que a atividade. E num momento tão importante para a história do país e, principalmente, de nossas cidades, a clareza e a consciência devem ser cultivadas de maneira mais intensa, para que não repitamos erros, façamos escolhas sensatas e sejamos, sobretudo, cidadãos comprometidos com o bem estar de toda a comunidade.

Camilo de Lélis Mendonça Mota é jornalista, psicoterapeuta holístico, e psicanalista em formação pela Sociedade Brasileira de Psicanálise Integrativa.


[i] “O menino teme a castração como realização de uma ameaça paterna em resposta às suas atividades sexuais, surgindo daí uma intensa angústia de castração”. (in: LAPLANCHE e PONTALIS. Vocabulário de Psicanálise. São Paulo, Martins Fontes, 1997, p.73)
[ii] RIBEIRO, Jorge Ponciano. Psicoterapia Grupo Analítico: teoria e técnica. São Paulo, Casa do Psicólogo, 1995, p. 11.
[iii] BACH, Edward. Os Remédios Florais do Dr. Bach. São Paulo, Pensamento, 2006.

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